Adaptação em Tempos de Crise 

22/03/2020

Texto de Herena Barcelos


ADAPTAÇÃO EM TEMPOS DE CRISE

Charles Darwin diz que "na história da humanidade (e dos animais), aqueles que aprenderam a colaborar e improvisar foram os que prevaleceram".
Há quem pense que a única necessidade de adaptação na pandemia do coronavírus seja o isolamento social. Pois vejam.

Como outros tantos profissionais, inclusive os batalhadores profissionais de saúde, não posso me recluir totalmente em função do trabalho. Muitos como eu também temem. Ao fim, volto para casa de meus pais hipertensos com mais de 60 anos. Imagino o desespero dos médicos em países mais afetados no momento.
Vivendo numa pequena cidade do sertão mineiro, que vem se adaptando à chegada da tecnologia com informações das mais diversas, difundir o respeito ao conhecimento científico é um desafio.
Não tenho nenhum problema em argumentar. Como profissional da saúde pública e da educação, é meu dever conscientizar as pessoas sobre o que aprendi e aprendo. Geralmente trocar conhecimento é muito gostoso.
Outras vezes nem tanto.
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- É mais um alarde. A letalidade do vírus é baixa. É só uma gripe.
- A questão é que muitas pessoas doentes representam uma sobrecarga do sistema de saúde, que já tem dificuldade de absorver toda demanda.
- Não custa nada prevenir, né?
- Isso.
Ponto pra saúde.
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- Isso não chega aqui. Nem Coca-Cola chega aqui (risos). Mas falando sério, acho que grande parte disso é para assustar a população.
- Segundo a curva epidemiológica, os números vão aumentar muito, e com o grande fluxo de viagens a possibilidade de se alastrar por todo país é grande. Não é preciso pânico. Mas é preciso cuidado.
Ponto.
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- Mas aqui não tem nenhum caso...
- Isso é muito bom, mas a ocorrência de um caso pode significar que o vírus já está em circulação. Então é melhor cuidar antes.
Ponto.
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- Quem criou o vírus foi a China. Eles querem vender vacina.
Impaciência.
- Isso vai ser difícil provar, mas o que importa é que ele está aí e as consequências podem ser graves. Mesmo que tenham a vacina, pode morrer muita gente antes que a vendam. Já está morrendo.
- Verdade.
Ponto.
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- Eu não me importo de pegar.
Ranço. Sorriso amarelo.
- A questão não é você. É que você pode contaminar outras pessoas que estão mais vulneráveis aos efeitos do vírus. Como idosos, hipertensos e diabéticos.
Ponto.
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Mas surgem momentos em que, pela sobrevivência, para alcançar a colaboração, é preciso improvisar até nos argumentos.
- Ops, num pode pegar na mão não, né? Por causa do corona (risos). Bestajada, toca aqui, moça.
- As aulas vão parar.
- Pra que isso? Eu num vou parar não. Num matei ninguém pra ficar presa.
- Na verdade, é isolamento social...
- Ainda bem que eu tenho meus outros trabalhos. Eu vou continuar na rua. Ninguém vai pagar meus boletos, quando eles chegar.
- Pois é. Se todo mundo colaborar, a crise passa mais rápido e...
- Isso é besteira, que nem outros vírus que já surgiram aí e passaram.
- Então, esses vírus também mat...
- Quem quiser pode me abraçar. Eu num tenho medo de pegar.
- É que você pode transmit...
- Dizendo que é só tomar água quente com limão. Lá em casa tem um pesão de limão (risos). Chegar aqui é bom que eu vendo 50 conto a dúzia.
- Essas notícias falsas...
- Tudo é mimimi. Só histeria. Povo fica esquentado a cabeça à toa. Isso é que nem uma gripe. Se esse trem chegar aqui, que eu acho que nem chega, no máximo morre um ou dois.
- Esse um pode ser sua avó!
Meu coração trincando a romper o silêncio.
- É. Vamos fazer então, já que virou decreto, não tem escolha mesmo.
- Isso.
Ponto. Triste ponto.

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